Já contei em minhas palestras que resolvi aprender a nadar bem tarde quando já tinha 29 anos. Na época minha capacidade de nadar era somente dez braçadas estilo “cachorrinho” para logo depois afundar onde quer que eu estivesse, caso não apoiasse meus pés. Por que eu não conseguia aprender a nadar? O que me impedia? O que me fez tomar essa iniciativa?
Em 2004, eu estava assistindo às Paraolimpíadas de Atenas, quando vi um brasileiro, nascido em Natal, ganhar seis medalhas de ouro e uma de bronze nas oito provas de natação que disputou sem usar suas pernas, já que ele sofrera uma paralisia cerebral por falta de oxigênio durante o parto, que afetou a mobilidade de suas pernas e sua coordenação motora. E sem falar que ele já havia ganhado três medalhas de prata e uma de bronze nas Paraolimpíadas anterior.
Enquanto eu tinha todos os meus quatro membros em perfeitas condições, mas colocava vários obstáculos e dificuldades para não aprender a nadar, meu conterrâneo Clodoaldo não só aprendera a nadar, como havia conquistado mais de uma dezena de medalhas olímpicas. Enquanto eu dizia: “Ah! se eu tivesse condição, aprenderia a nadar”, vi um brasileiro que se esforçou para coordenar suas braçadas subindo ao pódio e cantando o hino nacional por seis vezes.
Confesso que cheguei a pensar que se eu nadasse perto do Clodoaldo, poderia até me afogar e ser resgatado pelo para-atleta, pois ele seria capaz de me segurar com um dos braços e nadar com o outro. Então, depois desse dia deixei de dizer “Ah! se eu tivesse tempo, Ah! se eu tivesse apoio, Ah! Se eu tivesse disposição, Ah! se eu tivesse dinheiro, Ah! Se eu tivesse…”
Passei a dizer: “Ah! Se eu não tivesse desculpas para fazer o que outros com mais limitações do que eu estão fazendo. Ah! Se eu não tivesse medo, Ah! Se eu não tivesse frescura, Ah! Se eu não tivesse desânimo, Ah! Se eu não tivesse…”.
Naquele mesmo dia descobri que o que mais me limitava não era uma deficiência motora, mas a pior deficiência que pode aprisionar um ser humano – deficiência de atitude mental positiva. Naquele mesmo dia me inscrevi numa academia em Recife e dois meses depois já estava nadando os quatro estilos. Agradeço ao Clodoaldo por uma das maiores lições que aprendi na vida e que agora quero compartilhar com vocês.
Diariamente dizemos a todos, e a nós mesmos, que não temos condições de alcançar o que poderíamos alcançar. Usamos a todo tempo a frase “Ah! Se eu tivesse…”, e limitamos ou bloqueamos nossas decisões e ações. Só que desde que conheci Clodoaldo passei a dizer “Ah! Se eu não tivesse…” e enumerar em seguida tudo o que eu criava como obstáculos, a fim de deixar claro para mim mesmo que todos esses obstáculos estavam somente na minha mente.
Muitas vezes chego ao cúmulo de pensar: “Ah! Se eu não tivesse visão o que faria numa situação dessas?”. E imediatamente agradeço a Deus por ter somente miopia e astigmatismo nos olhos. Se pensarmos com clareza um deficiente visual pode ter mais visão do que um que não tenha deficiência visual. Por quê? Porque um cego remove todos os obstáculos e segue em frente amparado por uma bengala. Porque tem a visão clara de que viver é superar desafios e medos.
Vá mais além e diga: “Ah! Se eu não tivesse audição…”. Tenho uma irmã deficiente auditiva que já trabalhou na Espanha por anos e chegou lá sozinha, encontrou seu trabalho sozinha, resolveu todos os problemas e superou tudo sozinha. Muitas vezes penso que ela realiza mais coisas do que muitos de nós, porque Deus lhe deu oportunidades de não dar ouvidos a muita bobagens, crenças negativas, frustrações e invejas dos outros. Talvez você precise de um minuto de surdez em sua vida para não ouvir sua própria voz que diz: “Não corra que você vai cair”, “Não se arrisque mais”, “Nunca serei feliz”, “Ninguém me ama”, “Não continue lendo esse artigo”.
Você poderia dizer agora a si mesmo: “Ah! Se eu não tivesse minhas pernas, o que mudaria em minha vida?”. O que mudaria nessa vida que você tanto pragueja? Muitas vezes alguém que vive numa cadeira de rodas vai muito mais longe do que você jamais chegaria. Mesmo encontrando todo tipo de obstáculos reais nas calçadas, transportes e acessos aos edifícios como temos no Brasil. Mesmo sentada numa cadeira de rodas, essas pessoas estão mais ativas e fazendo mais diferença do que muitas que estão hoje sentadas numa cadeira no escritório ou num sofá em frente à televisão.
Talvez você precisa de uma vez por todas dizer: “Ah! Se eu não tivesse uma desculpa para simplesmente começar uma vida nova, feliz e sem deficiência”. A pior deficiência foi e sempre será aquela que criamos em nossas mentes. Quanto à Clodoaldo, ele segue como o brasileiro com o maior número de medalhas olímpicas de ouro (entre atletas e para-atletas), brasileiro que não se faz de coitadinho e brasileiro que não desiste nunca. E, você, que tal fazer como esse para-atleta e parar de dar desculpas a si mesmo? A maior deficiência é querer ser deficiente.
Ah! Se eu não tivesse medo de escrever!
15/11/2013